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24 abr / 19:00

Visitação

17 abr - 22 jun / 2014

temporada de projetos

Miguel Penha

Dentro da Mata


Marcio Harum entrevista Miguel Penha

Marcio Harum: Como você visualiza a tua própria exposição, agora montada e em exibição aqui no Paço das Artes? Pode descrevê-la tecnicamente, se assim o desejar.

Miguel Penha: A exposição “Dentro da Mata”, composta por nove trabalhos, em que dois deles são pinturas em acrílica sobre tela, possui uma obra que representa uma típica cena de cerrado, mais precisamente uma vista do interior do Parque Nacional Chapada dos Guimarães, em Mato Grosso —um dos temas de interesse de minha produção, juntamente com a pesquisa sobre a vegetação da floresta amazônica. Quando estou pintando a óleo, me envolvo bastante com os modos de utilização da cera da carnaúba e os secantes em pó, que dão forte destaque as colorações. O óleo que é retirado da tinta não realça muito o brilho, assim o que resta é uma pintura mais seca, parecida e talvez próxima dos efeitos da encáustica, em que as cores são suavemente destacadas em seu aspecto. 

Como a minha pintura é calcada na luz natural do centro-oeste brasileiro, e como filho de índios, nascido em Cuiabá, mas crescido entre São Paulo e Brasília (meu pai Xiquitano, minha mãe Bororo), desde a minha infância, venho conhecendo bem a vegetação, pois andei muito com o meu pai pelas matas, caçando e coletando frutos no cerrado, e nos últimos tempos, a região do cerrado tem sido cada vez mais assombrosamente destruída, e o trabalho que faço tem foco também no esclarecimento geral do que vem acontecendo no entorno. Por isso, busco retratar com a ajuda dos elementos da natureza, um olhar bastante pessoal, aproveitando-me de ângulos e perspectivas que são retirados de minhas caminhadas e andanças, do conhecimento sincero que possuo por entre vários povos da floresta, do uso medicinal, com o preparo tradicional de plantas e ervas. Procuro trazer tudo isso de uma só vez, numa composição única, que possa ser recriada espontaneamente por mim mesmo, ao selecionar novamente as espécies e ter que refazer por imaginação alguns dos ambientes desta magnífica flora.

MH: Você tem predileção por estudos de botânica em sua pesquisa, ou interesse por algumas espécies e ecossistemas específicos? O que te chama mais a atenção é a planta, a vista, o bioma? O que tanto pinta e que está presente agora mesmo na exibição do Paço? São retratos da paisagem?

MP: Pinto o bioma, as espécies, mas pinto também, sob forte impacto visual, a sensação de beleza que existe na mata. Tento transmitir ao visitante os sentimentos de se estar diante de tal maravilha. Alguns desses exemplos são parte do que estou mostrando em minha exposição: o buriti, o ubim, que é uma palmeira amazônica, o cafezinho e outras plantas, em meio a uma paisagem que é ao fim o resultado de meu pensamento e experiência, baseados em conhecimentos verdadeiramente ancestrais.

MH: A que locais especificamente o teu trabalho busca remeter? Existem mesmo essas localidades, ou são apenas meras aproximações topográficas? Ou todas essas visões são parte do teu imaginário?

MP: Apesar de qualquer poética particular, sobretudo a presença é a da Chapada dos Guimarães. Por exemplo, posso andar no mato demoradamente com uma pessoa, e depois ao comentar sobre a caminhada, às vezes acontece de perceber que a pessoa que me acompanhou não sabe absolutamente nada sobre os lugares por onde passamos juntos há pouco. Daí tenho que voltar sozinho na mata e fotografar justamente aquele ponto, aquele exato local, aquele detalhe.
A exposição se divide entre duas áreas, cerrado e mata, que são as mesmas condições naturais justapostas encontradas na região em que vivo. É chocante lembrar que do caminho entre os estados do Mato Grosso a Goiás, pela estrada, na atualidade, o que temos apara avistar são infindáveis campos de plantação de algodão e soja, e mais nada. Contudo, tento recuperar a história visual da região em meu trabalho, registrar essa mesma vegetação. Dou os exemplos da palmeira paxiuba, usada pelos seringueiros e pelos indígenas na construção rudimentar de assoalhos de suas casas e palafitas na região amazônica e no Mato Grosso, do pequizeiro do cerrado, que finalmente foi tombado pelo patrimônio ambiental nacional —não se derruba mais as árvores desse fruto tão utilizado pelos índios até a zona do alto do Xingu. Estão presentes em meu trabalho os igarapés de água limpa, o babaçu, o marimbondo-tatu, a mata-verde das palmeiras bacaba, que é amplamente utilizada na alimentação e para o preparo de sucos. A palmeirinha ubim, tão difundida pelos seringueiros e indígenas como material ideal para se fechar a cobertura das casas. Outra localidade inspiradora é a reserva do povo Krahô, às margens do Rio Brilhante, retratada por mim como se fosse ocasionada por uma sensível memória fotográfica.

MH: Como é o teu dia a dia de ateliê? Você vive unicamente do teu trabalho?

MP: Acordo cedo e pinto das 7 até as 11h da manhã, almoço, descanso um pouco, e à tarde pinto mais umas três horas, todos os dias. Vivo da minha pintura. Pinto há muito tempo e sou reconhecido por isso em Cuiabá. No estado do Mato Grosso, temos que nos lembrar disso, não há nenhum curso superior no ensino das artes. Se alguém quiser estudar e se formar nesse campo, tem que obrigatoriamente sair de lá e vir viver em São Paulo. Me preocupo muitíssimo com as questões de preservação e de politica ambiental também. O isolamento, a distância e o transporte caríssimo, ao qual estamos sujeitos para locomovermos pelas regiões do país, são os efeitos colaterais que mais vão se tornando rapidamente passíveis de gerar descaracterização e destruição das narrativas culturais regionais.

MH: Qual a tua expectativa em participar como artista selecionado da Temporada de Projetos? Em relação a isso, qual a tua possível contribuição?

MP: Como artista, o que espero é divulgar, aprimorar, inovar o meu trabalho. O meu desejo constante é o de estudar a pintura, as cores, a química, sua durabilidade, técnicas de conservação. De poder crescer, evoluir, trocar com outros artistas, ver o meu trabalho sofrer transformações positivas e estar mais sujeito aos avanços tecnológicos.

MH: Como você se relaciona com a luz no teu trabalho, natural e artificial? De onde vem a luz que entra na tua pintura? E a da tua exposição?

MP: Trato a luz como eu a vejo na mata. A luz da natureza é uma fonte de inspiração muito forte para mim.

MH: Que rumo você gostaria de dar ao teu trabalho daqui em diante? Quem exige mais: você dele ou ele de você?

MP: Como sou bastante crítico, exijo muito de meu trabalho. Mas o que realmente me atrai são as cores. Sinto que o meu trabalho pode dar um salto importante, mas não sei como isso vai de fato acontecer. As pinceladas e as cores tem mudado, trabalho com doze cores a óleo e quatro em acrílica. Os resultados estão se modificando devido a essas experimentações. Quero poder trabalhar a luz sem usar o branco. Eliminar o branco e iluminar com cores. A iluminação da cor.

MH: De novo, mas ao contrário, como você deseja que o teu trabalho prossiga, qual a direção a tomar?

MP: Só sei que preciso continuar trabalhando, pintando, para ver aonde o meu trabalho consegue chegar e até aonde ele vai me levar em relação as novas sensações com as cores, com os grande formatos das telas de até 3 X 6m, montadas sem bastidores, direto sobre lonas de caminhão. Em meu trabalho, busco o sentido mais real até mesmo na casca das árvores.

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24 abr / 19:00

Visitação

17 abr - 22 jun

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sobre o artista

Descendente de indígenas, Penha considera-se um artista contemporâneo autodidata. Dedica-se à pintura, sempre tendo como tema as matas e cerrado brasileiro. Participou de diversas exposições e salões de artes, tanto no Brasil como no exterior. Seus trabalhos também ilustram diversos livros e catálogos. Em 2009, recebe o Prêmio de Artes Plásticas Marcantônio Villaça, promovido pelo Ministério da Cultura e Fundação Nacional de Arte. 

visitação

De 17 de abril a 22 de junho de 2014

abertura

24 de abril - 19:00 horas

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